O Espantalho do Batman e a elasticidade de preços

Por Raul Candeloro

Hoje quero defender uma tese que parece polêmica, mas que faz todo sentido quando você entende a lógica. Acompanhe-me no processo, pois quero mostrar algo que pode duplicar ou triplicar sua lucratividade.

É um texto um pouco mais longo e precisa que use o cérebro, então se está com preguiça ou procurando algo mais motivacional, recomendo que leia depois. Mas se quer pensar em algo importante, de alto impacto, estratégico… Este é o lugar e o momento.

Vou fazer uma afirmação e, depois de fazê-la, quero que pare e pense um pouco nela antes de continuar.

Para todos os clientes que realmente valorizam e se beneficiam dos produtos e serviços que você vende, você provavelmente está cobrando muito barato.

Para todos os clientes que não valorizam e não entendem os benefícios dos produtos e serviços que você vende, você SEMPRE vai estar cobrando caro.”

(Pausa para reflexão)

Agora vem minha grande pergunta: quais desses dois tipos de cliente você tem levado em consideração ao estabelecer seus preços? Ou descontos?

A questão elasticidade de preços faz parte do dia a dia de quem trabalha com vendas, mas peça para qualquer pessoa definir o conceito e vai notar que NINGUÉM sabe o que é.

Já me contrataram mais de 200 vezes para dar palestras motivacionais. Para falar de elasticidade de preços? Nunca.

Como diz meu amigo e sócio Marcelo Caetano, preço faz parte do jogo, mas não pode ser O jogo.

A questão toda é que a maior parte das empresas está precificando usando como referência clientes que querem comprar preço, pois não valorizam ou não entendem corretamente os benefícios de comprar de você.

Temos um problema sério aqui, principalmente se você notar que a equipe de vendas invariavelmente é remunerada, recompensada e reconhecida (os 3 grandes R’s da motivação) por VOLUME de vendas e faturamento.

Isso faz com que se junte a fome com a vontade de comer: clientes pedem descontos, vendedores dão descontos e fica todo mundo feliz.

Todo mundo menos a empresa, que tem uma carga cada vez maior de custos e não consegue ter um lucro condizente com o trabalho e risco assumidos no negócio.

Como resultado, tenho recebido cada vez mais demandas, tanto de palestras e workshops quanto de consultoria, por trabalhos que visem melhorar as técnicas de negociação, fechamento e aproveitamento de oportunidades (upsell, cross sell, positivação, etc.) por parte das equipes de vendas.

Isso tudo é ótimo, mas é tático. Precisamos também ter uma conversa inteligente e mais estratégica sobre como lidar com essa pressão nos preços, sem terceirizar toda a responsabilidade para a equipe comercial.

Existem alguns motivos claros para o cliente pedir desconto:

  • Seu produto/serviço claramente não tem nenhum diferencial.
  • Sua empresa claramente não tem nenhum diferencial.
  • O vendedor claramente não tem nenhum diferencial.
  • O produto/serviço tem diferenciais, mas eles não são comunicados nem valorizados efetivamente.
  • A empresa tem diferenciais, mas eles não são comunicados nem valorizados efetivamente.
  • O vendedor tem diferenciais, mas eles não são comunicados nem valorizados efetivamente.
  • O cliente vai comprar de qualquer jeito, mas só está querendo negociar para ver se consegue pagar menos.

Exemplo típico do problema:

Um grande amigo meu liga para um curso de inglês online para obter mais informações. Descobre que o preço cobrado é de US$ 80/mês. Ao comentar que encontrou na internet alguns comentários negativos e reclamações sobre o curso, o vendedor responde muito rapidamente à possível objeção, superficialmente abordando as reclamações e diz: “Façamos o seguinte: vamos fechar por US$ 75/mês?”.

Essa conversa parece de sanatório mental. Um está falando de uma coisa e o outro responde outra. Pior do que papo de bêbado. Mas é o que vemos todos os dias em vendas. E quem sofre com isso é a empresa, que não valoriza o que tem de melhor (seus diferenciais) e ainda vê suas margens de lucro caírem continuamente.

Neste exemplo específico, ao invés de descobrir o que o cliente realmente busca num curso de inglês, o vendedor imediatamente usou a única ferramenta que ACHA que tem disponível (o desconto). Com certeza absoluta não deve assinar a VendaMais.

Se um vendedor numa situação dessas perguntasse algo que ensinamos no curso Alta Performance em Vendas, por exemplo, não só se distinguiria completamente da concorrência como, principalmente, manteria a integridade dos seus preços (e, por consequência, a lucratividade).

Uma simples pergunta como “o que mais irrita o senhor por não saber falar inglês fluentemente?” já levaria a conversa para um lado MUITO mais construtivo e interessante, inclusive dando argumentos fantásticos para lidar com objeções.

Quantos vendedores fazem isso? Muito poucos.

Mas não é questão de culpar o vendedor. Ele faz isso porque alguém deixa. Ou melhor – alguém está estimulando-o a fazer isso.

E tem mais:

  • Quantas empresas têm de verdade a coragem de se posicionar fortemente no mercado? E por fortemente eu quero dizer microsegmentar.
  • Quantos cursos de inglês existem na sua cidade? 10? 20? E cursos de inglês especializados? 1? 2? Adivinha qual cobra mais caro?
  • Quem cobra mais caro na medicina: especialista ou generalista?
  • Qual advogado cobra mais caro: especialista ou generalista?
  • Qual restaurante cobra mais caro: especialista ou generalista?

Podemos continuar assim infinitamente.

Quanto mais segmentado e especializado você for, menos concorrência terá. Melhor vai ser seu atendimento e os benefícios oferecidos aos clientes. Mais clientes vão procurá-lo diretamente. E (muito!) melhores as suas margens de lucro.

Especializar-se tem uma lista imensa de vantagens. Quando você escolhe um segmento de clientes e dedica-se a ser o melhor do Brasil para eles, vai ter muito mais trabalho do que consegue dar conta. Basicamente, os clientes vão vir atrás de você.

Porém, note que esta é uma decisão ESTRATÉGICA. Não é responsabilidade do vendedor criar diferenciais. É, sim, responsabilidade do vendedor educar o cliente em relação aos diferenciais, reforçá-los, relembrá-los, valorizá-los. Mas não criá-los.

Saber lidar com os medos

Infelizmente, a maior parte das empresas comporta-se como se estivesse enfrentando o Espantalho e faz exatamente o contrário: tenta agradar a todo mundo, com medo de ‘perder’ clientes. E acabam sendo medíocres.

Se você ficou pensando no Espantalho acima, deixe-me explicar. Espantalho era um inimigo do Batman. Ele espalhava um gás quimicamente alterado que, quando atingia uma pessoa, fazia com que seus maiores pesadelos parecessem virar realidade.


O Espantalho levou Batman e Gotham City ao desespero com seu gás mágico maldoso, mas o mais interessante é que, de verdade, ele não tinha poder algum. Apenas usava o medo que as pessoas já tinham dentro de si em proveito próprio.

Ao serem atingidas pelo gás, as pessoas ficavam enlouquecidas e se descontrolavam completamente, fazendo qualquer bobagem que parecesse lhes trazer um pouco de conforto. Sempre buscando fugir de um medo que não existia de verdade – na realidade estava apenas dentro delas.

Tenho notado hoje muitas empresas lidando com seus espantalhos da mesma forma: correndo desesperadamente dos seus próprios medos e fazendo um monte de bobagens.

Argumento típico desta turma é o de ter medo de perder clientes ao se especializar. Isso é o mesmo que dizer a um cardiologista que ele perde clientes por não fazer cirurgias no joelho. Experimente dizer isso a um cardiologista e note a expressão de incredulidade nos seus olhos. Entretanto, empresários e vendedores repetem esta bobagem todos os dias.

Outro argumento típico que ouço: “não consigo me diferenciar, não tem nada que eu possa fazer“.

O que eu recomendo na prática:

  • Pergunte aos seus clientes o que mais os irrita ao comprar e elimine esses irritadores.
  • Descubra por que já trocaram de fornecedor.
  • Descubra o que o cliente ganha, os resultados positivos de comprar de você.

SEMPRE existem oportunidades de se diferenciar. O problema é que a maior parte das pessoas usa sua energia justificando por que algo não pode ser feito ao invés de experimentar e tentar fazer.

Quantas empresas estão educando seus clientes, treinando seus clientes, medindo resultados de clientes? Quase nenhuma. (Se você está fazendo isso, mande-me um e-mail ou comente abaixo, pois adoraria entrevistá-lo/a.)

Quantas estão se especializando tanto que são as únicas do Brasil a oferecer um atendimento excepcional? Que deveriam ser visitadas por outras empresas como referência? Você estaria preparado para ser visitado? (Se sim, mande-me um e-mail ou comente abaixo, pois adoraria entrevistá-lo/a!)

Essas empresas são minoria, mas existem. E pode ter certeza de que têm mais trabalho e clientes do que conseguem atender.

Agora vem o outro lado: quantas empresas estão brigando por preço?

Empresas mal posicionadas são invariavelmente empresas medíocres. Não digo isso para ofender ninguém – é simplesmente uma constatação. Depois que digo medíocre as pessoas se fecham e não prestam atenção em mais nada que digo, mas não consigo achar palavra que descreva melhor esse ‘mais ou menos’, essa “mornice” sem sal.

Aceitar a mediocridade é dolorido, mas passo necessário na evolução. Quer chamar de algum outro nome mais bonito? Sem problemas. A questão não é o nome em si, mas sim a necessidade clara de se especializar, escolher um nicho de mercado e ser O MELHOR nesse nicho. Você quer que as pessoas comentem sobre você e digam: “XYZ? Ah… Só (seu nome) consegue isso. São de longe os melhores. Se você realmente quer resolver isso, fale com eles. Recomendo”.

E se falarem do seu preço, você quer que digam: “São bem mais caros do que o resto do mercado, mas vale a pena cada centavo, porque realmente merecem“. Isso é posicionamento.

Tem que ter coragem para fazer isso. Segmentação, posicionamento e precificação são 3 das escolhas mais importantes que fazer. Mas são ESCOLHAS (e não reações!).

Precisamos entender isso de uma vez por todas e tirar do vendedor a pressão de ter que magicamente diferenciar o que vende. (Exemplo típico: lojas da Apple, o varejo que tem o maior faturamento por m2 do mundo inteiro, NÃO TEM vendedores).

Empresas medíocres têm lucros merecidamente medíocres.

Então, cuidado com o gás mágico do Espantalho. Um cliente que briga por preço está usando um gás mágico baseado nos medos do vendedor (e da diretoria da empresa que recompensa, remunera e reconhece esse vendedor).

O medo de perder negócios está criando um ciclo vicioso muito perigoso na maior parte das empresas.

Termino este texto repetindo a minha afirmação do começo do artigo:

Para todos os clientes que realmente valorizam e se beneficiam dos produtos e serviços que você vende, você provavelmente está cobrando muito barato.

Para todos os clientes que não valorizam e não entendem os benefícios dos produtos e serviços que você vende, você SEMPRE vai estar cobrando caro.”

Essa é a grande pergunta: a equipe comercial da sua empresa está trabalhando, agregando valor e direcionando todo seu foco, sua criatividade e energia para cobrar mais dos clientes e aumentar a lucratividade… Ou para cobrar MENOS, comprometendo a lucratividade?

Fica agora o convite a você pensar seriamente nisso e, por consequência, analisar para qual dos dois tipos de cliente você tem dado mais atenção ultimamente.

Desculpe pelo texto longo e se, porventura usei alguma expressão mais dura, entenda que minha intenção é a mais positiva possível – combater o Espantalho. E preciso da sua ajuda.

Um bat-abraço e boas vendas,

Raul Candeloro

→ Editorial originalmente publicado na edição de Junho/2014 da VendaMais.

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